sábado, maio 26, 2012

O anti-facebook está condenado a vagar sem sossego sob o teto daquela velha esquina


O programa Globo News Literatura de ontem, 25/05, fez um grande desfavor para a humanidade – e principalmente para aqueles que amam a literatura: o registro em vídeo do escritor Dalton Trevisan. Os autores da façanha foram o escritor Claufe Rodrigues, que apresenta o programa, e o repórter cinematográfico William Torgano. Claufe fez questão de nos lembrar que se trata do primeiro registro em vídeo de Trevisan.
Mas o desfavor do programa da Globo não parou aí. A reportagem mostrou ainda a casa em que mora Trevisan. Sem avisar que estava filmando, do portão o autor da matéria chamou o dono da casa. Quando se aproximou e viu a câmara, Dalton voltou imediatamente. Apesar de Trevisan não ser nenhuma dessas efêmeras celebridades promovidas pela imprensa burguesa para nos distrair com bobagens e nos fazer esquecer nossos reais problemas, dá para imaginar o dia seguinte: fotógrafos e câmeras de plantão naquela esquina de Curitiba a fim de novos registros do mais novo ganhador do Prêmio Camões.
O mote para a matéria do Globo News Literatura foi exatamente esse: o Prêmio Camões, concedido a escritores em língua portuguesa, teve Dalton Trevisan como vencedor. O anúncio da 24ª edição do prêmio foi na segunda, 21.
O escritor curitibano é um dos mestres do conto. Suas narrativas curtas, diretas ao ponto, revelam as neuroses, o falso moralismo, os instintos mais torpes de personagens que se esgueiram na noite curitibana e no dia-a-dia da cidade. Apesar do sucesso de sua obra, Trevisan sempre foi avesso a badalações e raramente se deixou fotografar, comportamento que levou a imprensa a batizá-lo com o título de um dos seus livros: “o vampiro de Curitiba”.
O desfavor da Globo consiste em tentar desvendar o mistério – quem é Dalton Trevisan -, quando esse mistério é um dos pontos mais fortes da relação entre os leitores e a obra de Dalton. Tenta desfazer um dos poucos mitos vivos da literatura. E, claro, vivemos numa época em que ninguém pode ficar sem rosto e nada pode permanecer oculto (o mito é o nada que é tudo, já disse Fernando Pessoa).
Mas há também uma falta de respeito com o cidadão Dalton Trevisan, cujo direito à privacidade (não dá entrevistas, nem gosta de ser fotografado) é conhecido de longe pela imprensa. Ou será que em tempos de facebook e reality shows já não se permite mais o direito das pessoas ao anonimato?
Claufe Rodrigues fez parte dos grupos Os Camaleões e Ver o Verso, que nas décadas de 80 e 90 promoviam recitais de poesia, primeiro no Rio de Janeiro, depois por todo o país. Que bela iniciativa. Mas agora ele está na Globo. Não é coincidência que um dos amigos de Claufe e, junto com ele, um dos realizadores daqueles recitais, seja o jornalista Pedro Bial, o “cronista” do Big Brother, o principal reality show brasileiro (ninguém pode ficar sem rosto, nada pode permanecer oculto).
Quanto ao anti-facebook Dalton Trevisan, está agora condenado a vagar sem sossego sob o teto daquela velha esquina de Curitiba, às vésperas do seu 87º aniversário (14 de junho).

Um comentário:

Luiz Fafau disse...

DALTON TREVISAN E O VAMPIRISMO NA REDE GLOBO


Foi numa sexta-feira, dia 25 de maio de 2012. Um Claufe ofegante caminha em direção à casa do vampiro. Os claufes são assim, destemidos na desmedida da infâmia. Alguns passos atrás dele um Torgano de porte médio. A maioria dos torganos tem esse porte. E ao que me consta são em grande número e possuem até uma comunidade no Orkut. Porte médio, eu disse. Pois esses dois cavalheiros, funcionários da Rede Globo de Televisão, lotados no canal Globo News e com serviços prestados ao programa Globo News Literatura, pararam na frente da casa do vampiro e começaram a gritar seu nome, como meninos com uma bacia de chuchu mascateando pela cidade. Nelsinhos de calça curta, com o perdão do mestre Dalton... http://luizfafau.blog.uol.com.br/